por Valmir.Nascimento
O ano de 2008 foi histórico para a Suprema Corte brasileira (
STF). Isso porque, como bem lembrou o ministro Gilmar Mendes em seu discurso de abertura do Ano Judiciário de 2009, o ano que passou ficou marcado por decisões que provocaram grande repercussão no cenário socieconômico e político do país, e também da comunidade internacional, como a controvérsia acerca da realização de pesquisas científicas com células embrionárias humanas e do início do debate sobre a demarcação contínua da reserva indígena Raposa Serra do Sol. Além, ainda, daqueles relativos à fidelidade partidária, à proibição do nepotismo no âmbito de toda a administração pública nacional, à edição de medidas provisórias sobre créditos extraordinários, à constitucionalidade da especialização das varas, ao piso salarial de professores, à limitação do uso de algemas.
Ao meu ver, algumas das decisões foram acertadas, outras nem tanto. Mas, independente de minhas impressões e percepções a despeito dos julgamentos pretéritos por parte dos ministros, a verdade é que o STF cada dia mais vem sendo palco de debates importantíssimos para a sociedade. Seus julgamentos ganham relevância na medida em que definem questões fundamentais que afetam a vida de todo cidadão.
Teoricamente, o STF sempre foi dotado de tal relevância, posto ser o representante máximo do Poder Judiciário e o guardião maior da Constituição Federal. Entretanto, em razão da possibilidade jurídica (absurda) de recursos dentro do ordenamento jurídicos pátrio, acontecia que a Suprema Corte acabava abarrotada de processos para decisão de questões secundárias, afastado-a, portanto, do seu propósito central.
Ocorre que, partir da Emenda Constitucional n.º 45, denominada de “Reforma do Judiciário”, que entre outras inovações criou instrumentos para a efetividade e a celeridade do processo, com os estabelecimento de filtros recursais, o STF começou a receber menos demanda, tanto é que no ano passado constatou-se a redução de 41% no total de processo distribuídos.
Como disse o Ministro Gilmar Mendes, “de tudo resulta que o desate do nó górdio que aprisionava a Corte na esdrúxula tarefa de apreciar recursos inviáveis ou improcedentes importou não só maior qualidade nas decisões proferidas, como também mais dinamismo e aproximação da sociedade, com evidente ganho nas relações de cidadania e do fortalecimento do Estado Democrático de Direito”.
Outro fator que vem abrindo espaço para a atuação ampla do Judiciário no Brasil é exatamente a ineficiência do Legislativo, que por não legislar sobre temas fundamentais acaba jogando para o STF a responsabilidade de “legislar atipicamente”, ou seja, decidir sobre assuntos que deveriam ser matéria de leis específicas, como aconteceu com a infidelidade partidária e o nepotismo no poder público.
Nesse contexto, então, o STF continua seu caminho, que vai com o tempo se alargando ainda mais, inclusive com decisões inovadoras. Para se ter uma idéia, já no ano corrente os ministros decidiram pelo direito de liberdade do réu até que o caso tramite em julgado, decisão essa que provocou efeito cascata em todas as esferas do judiciário.
Alguém pode indagar sobre a razão pela qual estou a escrever sobre esse tema aqui no blog. Esse é o xis da questão.
A primeira razão é que esse blog não fala somente sobre religião, igreja, fé e espiritualidade, mas também, na medida do possível, sobre direito, política, economia, mídia, jornalismo e quiçá sobre ornitorrincos.
A segunda razão é que a atuação do Suprema Corte do Brasil tem tudo a ver com cosmovisão, importando, assim, a todo cristão. O direcionamento das questões mais relevantes no meio social deve despertar a atenção da igreja, que não pode viver de olho no seu próprio umbigo, mas sim, com os olhos voltados para fora. Aliás, igreja em grego é eklesia que quer dizer “chamado para fora”. Mesmo porque as decisões proferidas pelo STF podem afetar e muito a atuação da igreja no plano social.
Observar a atuação do STF é importante também porque o panorama ideário que domina a seara jurídica atual não é dos melhores. O desconstrucionismo é a idéia que reina. Segundo essa teoria, a linguagem não revela significado, antes é uma construção social. E se o texto não possui um significado inerente a ele próprio, cabe ao intérprete dizer o seu significado. E se cabe ao intérprete desconstruir ou dizer o seu significado, no caso da lei, então, a intenção do legislador já não tem tanta validade, de modo que o julgador é o senhor da interpretação, aplicando a lei em conformidade com o contexto.
Assim, é importante estarmos atentos aos passos do STF, afinal, assuntos como aborto, homofobia e liberdade de expressão em breve baterão às portas do pretório excelso, daí veremos como as coisas ficarão.